Durante a entrevista, os músicos discorrem sobre suas influências, gostos e até política, como a opinião sobre a legalização da maconha e o papel da juventude
Vinda lá do batuque da cuíca de Vila Isabel, no Rio de Janeiro, uma banda de “reggae roots” tem representado com dignidade o gênero no Brasil e arrastado multidões por onde passa. Ponto de Equilíbrio nasceu da união de oito músicos cariocas com características muito distintas, mas com o objetivo em comum de difundir o tradicional reggae jamaicano e a cultura rastafári pelo país.
A banda, na estrada há mais de dez anos, tornou-se uma das principais referências de reggae no Brasil ao resgatar às raízes do movimento e utilizar a música como instrumento de resistência sociocultural. As letras, compostas pelos próprios integrantes, transmitem mensagens de igualdade, amor e justiça. O som é embalado por influências de dub, samba e de outros ritmos como a capoeira de Angola, o maculelê, a salsa e o maracatu.
O nome da banda, por si só, resume o estilo dos músicos: o equilíbrio entre o céu e a terra, o positivo e o negativo, o bem e o mal. “Esse é o ponto que todos nós buscamos e para onde todos retornaremos, quando terminada nossa missão nessa vida”, explicam os músicos para o site da UNE.
Mesmo sem tocar em rádios ou ter gravadora própria, a cada show o Ponto de Equilíbrio conquista um público maior e mais fiel. Eles tocam com frequência nas capitais do país e lotam as casas por onde passam. Algumas apresentações já chegaram a reunir 30.000 pessoas, como em Salvador e Fortaleza. A banda já participou de uma atividade da UNE, em 2005, durante a 5ª Bienal de Arte, Ciência e Cultura.
Ponto de Equilíbrio é formado por Helio Bentes (vocalista), Pedro Pedrada (baixo), Márcio Sampaio (guitarra base), Tiago Caetano (teclados), Rodrigo Fontenele (percussão), Marcelo Campos (percussão), Lucas Kastrup (bateria) e Ras André (guitarra solo). Na entrevista a seguir, os músicos falam sobre suas influências, gostos e até política, como a opinião sobre a legalização da maconha. Confira abaixo:
Quando falamos de reggae no Brasil, o Ponto é uma das referências. Como vocês caracterizam o reggae brasileiro? Existe um movimento crescente de bandas e influências?
Antes de nos juntarmos já haviam bandas de reggae no Brasil, grandes festivais com dias só para o movimento e programas de rádios só para a música. Com o passar dos anos isso mudou, vários festivais e rádios deixaram de existir e o reggae ficou sem apoio da grande mídia. Felizmente, com a chegada da internet, o reggae conseguiu ultrapassar essa barreira e todos puderam ter acessos às bandas e seus discos, criando uma mídia alternativa e particular para cada banda. Mas, como movimento, falta a inserção da cultura por meios de oficinas, mídias alternativas e rádios pra introdução da música reggae na sociedade.Para vocês, o reggae brasileiro difere um pouco de outras bandas internacionais?
O reggae pelo Brasil tem seus diferentes sotaques e em cada região surge suas características de acordo com suas influencias musicais. Mas, as bandas nacionais e internacionais estão sempre bebendo da mesma fonte, a Jamaica.A música do Ponto, inclusive, carrega na batida o reggae jamaicano, é visível. Mas, fora isso, vocês tiveram alguma influência direta da música brasileira?
Sim, nós somos todos de um bairro tradicional do Rio de Janeiro, Vila Isabel, que é considerado o berço do samba. Marcelo Campos, um dos integrantes, é filho do compositor Gracia do Salgueiro e fizemos, inclusive, um versão de “Janela da Favela” em reggae que ficou bem original ( http://youtu.be/cJdN9rzXkC4 ). Assim como bebemos em fontes da música Jamaica e brasileira, também nosso guitarrista André Sampaio está numa viagem pela África ampliando seus horizontes na música para trazer à banda o que tem de mais refinado no continente. Nossas raízes, se quisermos, podem ser infinitas.O reggae ficou conhecido como música de protesto, que exalta a igualdade através de mensagens de amor e paz. Vocês seguem alguma ideologia política para compor?
Nossas mensagens vêm da vivência de cada um da banda. Temos músicas com três compositores e músicas que já chegam praticamente prontas; outras trabalhadas em conjunto nos ensaios. Todas sempre de acordo com a atualidade da banda numa perspectiva brasileira e mundial.O que é a figura do Bob Marley para vocês?
Bob Marley é sinônimo de boas músicas, melodias e composições. Ele foi a figura que popularizou o reggae e a cultura rastafari pelo mundo todo. Hoje em dia, ainda leva suas mensagens de igualdade e paz quando tocadas pelo mundo afora.A maioria do público que frequenta os shows é jovem. Como vocês enxergam a juventude hoje? O reggae ajuda a buscar um caminho melhor?
As músicas são feitas com amor e isso pode ser sentido quando tocamos. Em nossas apresentações, a plateia fica envolvida e o jovem leva para casa aquele sentimento.O Ponto de Equilíbrio tocou na 5ª Bienal da UNE, uma atividade que realizamos de dois em dois anos em que jovens do país inteiro se reúnem pata discutir a diversidade da cultura brasileira e debater os novos rumos para a construção de um país melhor. Vocês lembram da atividade? O que acham que mudou de 2007 para cá? Do ponto de vista da maturidade da banda e do Brasil.
Sim, eventos como esse promovem encontros de jovens de diferentes cantos do Brasil, que debatem temas em comum e acabam aprimorando seus conhecimentos, assim como a banda vai progredindo com sua música, pois a arte é puro sentimento e se aprimora com a prática e com o passar do tempo. Lançamos o terceiro disco no fim de 2009 (Dia após dia lutando) e agora planejamos o nosso primeiro Dvd para esse ano ainda!!A cultura do reggae é muito rica e antiga, mesmo assim, muita gente associa reggae estritamente com o uso da cannabis e enxerga o movimento com um certo preconceito. O que vocês acham dessa associação?
Quem associa dessa maneira acaba por se enganar, pois a energia do rasta é positiva e prega o sentimento do amor entre todos. Sabemos que a cultura reggae é antiga, mas a cultura do uso da cannabis é muito mais antiga e faz parte de uma religião. Para quem está nessa, não venha classificar que quem ouve reggae fuma, pois existem roqueiros, sambista, brega, pagodeiro e até gospel que fazem uso da cannabis.Aproveitando o gancho dessa pergunta acima, como vocês avaliam a política que o Brasil adota em relação as drogas? Acham que a maconha deveria ser legalizada?
Acho que não deveríamos tratar a cannabis como droga, pois a cannabis é uma planta natural. Como podemos, dessa forma, classificar uma planta que foi Deus que criou? Fica a pergunta, por que não pode plantar? O resto dos alucinógenos devem ser tratados sempre da melhor maneira para toda a sociedade.E como vocês acham que o Brasil enxerga a juventude hoje? Os jovens ainda são vistos como problema, em vez de solução?
Acho que a maioria das grandes mídias manipulam desse jeito. É só lembrar do caso da USP, em que um jovem foi violentado por ser negro, sem justificativa alguma, e a imprensa não chegou a aprofundar o debate. O jovem não tem como fugir, um dia será ele que assumirá tudo. Agora é trabalhar para que as cabeças desses jovens sejam as mais sensatas e unidas, para que tenhamos um futuro melhor.Patricia Blumberg
www.une.org.br
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